QUEM DE FATO LUTOU PELO FIM DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL?

Dizer que a Princesa Isabel foi a responsável pelo fim da escravidão no Brasil em 13 de maio de 1888 é desacertado e grosseiro. O que ela fez nada mais foi do que assinar um documento, que podemos questionar até que ponto não se trata de uma "letra morta" na época e nos dias atuais. Afinal a escravidão nunca acabou de fato no Brasil e é fenômeno mais recorrente do que se imagina, seja no espaço rural ou mesmo no urbano. Ainda sim, considero que a Lei Áurea é relevante, pois no termo da lei considera a prática da escravidão como ato ilegal.

No entanto, eu não questionarei no texto a pertinência da Lei Áurea, mas sim a da sua signatária, no caso, a Princesa Isabel. Vale a reflexão, visto que, é muito comum em todo 13 de maio, considerações equivocadas à respeito da herdeira da Casa dos Bragança e da abolição da escravidão.

Em primeiro lugar, dar os louros da vitória a quem nunca se engajou na luta pelo fim da escravidão, no caso, à Princesa Isabel é no mínimo desacertado. Ao se fazer isto, não só:

1) se aceita toda a publicidade que a família real fez sobre a assinatura do documento;

2) se afirma na consciência coletiva que as conquistas de direitos humanos foram resultantes de concessões do Estado e não da organização e da luta popular.

O que é importante se considerar então para a desconstrução do mito da Princesa Isabel como abolicionista?
A) O pai da princesa, Dom Pedro II foi o responsável por preservar a escravidão no Brasil por 48 dos 49 anos em que foi rei. Logo, analisando a prática política do rei podemos dizer que:

a) foi indiscutivelmente partidário da escravidão;

b) preservou o regime escravista o quanto pôde para se manter no poder, visto que, estruturou a sua sustentação política na elite branca, agrária e escravista. Impossível não dizer, então, que a conduta do rei demonstrava a sua verdadeira paixão pelo poder político, ao mesmo tempo, que afeto algum pelas causas humanitárias dos negros e negras.

Neste ponto, uma pessoa de leitura atenciosa diria para si: - Tá certo, pro, mas não é porque o pai era apoiador da escravidão, que a filha também tinha de sê-lo?

B) Sem dúvida esta seria uma reflexão pertinente, no entanto, a princesa Isabel jamais tinha se manifestado publicamente nem sequer uma abolicionista de grandeza minúscula. Mas, aquilo que não demonstrava publicamente, para o fim de se manter uma falsa imagem pública, no foro privado se apresentava. Servem como fonte as cartas, onde o desprezo e ironia da princesa, pela causa da abolição, eram evidentes. A historiadora Mary del Priore, no livro O Castelo de Papel baseada em arquivos do IHGB e do Museu Imperial de Petrópolis, deixa esta característica do caráter da princesa muito bem destacada.

Por exemplo, a resposta dada pela princesa em carta endereçada a Condessa de Barral sobre o jornalista e abolicionista José do Patrocínio, é uma dentre inúmeros exemplos da forma como a princesa da casa dos Bragança tratava a luta abolicionista e os envolvidos nela: "Que demônio pode ter-lhe contado tantas coisas, querida? São os horríveis artigos de José do Patrocínio? Se você não pode ignorá-los, mostre que eles lhe são desagradáveis.”  

Bem, se não foi a princesa Isabel a responsável pela abolição da escravidão no Brasil quem de fato foram os seus responsáveis? A resposta é simples e basta você pensar em quais seriam os(as) maiores interessados(as) no fim dela.

Abaixo uma fração das pessoas que foram fundamentais na luta pela abolição e que não devem faltar em uma boa aula sobre o tema. Mas não devemos esquecer que às "personalidades" devemos somar as de outras tantas gentes, tornadas anônimas por historiadores racistas dos primórdios da República ou por "Reformas Educacionais" típicas da Casa Grande. São elas: as gentes da maloca, os favelados, os libertos, os cativos, os Caifazes, o movimento abolicionista e todas as pessoas que lutavam cotidianamente com a escravidão e o racismo no Brasil. Estes foram os verdadeiros responsáveis pelo fim da escravidão, jamais uma princesa branca, da elite lusitana e escravista.

Imagem produzida pela BBC Brasil. 13 de maio de 2018

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