doc001-Manifesto Antropofágico. Bon'apetit curumins!

Queridos alunos e alunas do 9º ano, esta postado para consulta o Manifesto Antropofágico, que antes de qualquer observação que se faça ao seu conteúdo deve ser considerado em sua primeira dimensão: MANIFESTO!
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Basicamente qual caldo dá razão para textos que venham a receber tal qualidade: . . . a de Manifesto! Sem dúvida não é somente o caráter informativo de seu conteúdo, pois esta é a natureza de todos texto produzidos, ou melhor, de toda a arte que resulta do engajamento criativo e criador do ser humano.
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Álias, engajamento é uma palavra conveniente a este questionamento que estamos propondo, pois, o Manifesto além de buscar informar, busca engajar aqueles pra quem fala!
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Mas diria neste momento um aluno (a) astuto: - Mas professor, não é natureza de todo texto engajar os leitores, o escritor, naquilo que pensa? Não seriam, portanto, todas as artes algum tipo de engajamento?
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Eu, evidentemente, responderia: - Sem dúvida notável aluna (o)! Mereces trazer, por observação de tamanho relevo, uns bombons para o seu professor! (;
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Outras considerações importantes sobre o Manifesto Antropofágico
Enfim, não esqueçamos carismáticos como o tema se enquadra dentro dos entendimentos que buscamos para compreender aquele Brasil que lá nos meados da década de 30 do século passado anseava fazer o trânsito do arcaico para o moderno. Outras considerações a este respeito, em aula evidentemente, pois dá pra escrever umas tantas páginas sobre o tema, afinal são tantos os arcaismos que perduram.
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Bem, retomando a discussão e deixando as digressões, por ora, de lado, o Manifesto Antropofágico nos é interessante dentro da matéria de discussão, como fonte que evidencia o que umas das forças de nosso variado "tecido social" estava pretendendo superar com um gênio criativo raro em nossa história.
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É certo que os Modernistas de 22, estavam enquanto sujeitos, construindo as bases disso que reconhecemos hoje como nação, dado que, nestas terras sob o trópico e infelizmente mirada pelo portuga Cabral, quem decretou a independência fora "el Rey" sucessor, é este mesmo o de Portugal, Pedro I, que para o espanto de nossos leitores também era português. Pode isso? Quem ouve a história não acredita, mas o fato é: Como um português sucessor do trono real decretou a independência de Brasil em relação à Portugal?
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Coisas nossas essas de querer tornar clara aquela anedota do "quem vem antes o ovo, ou a galinha?". Bem, como ninguém nunca lembrou de colocar o galo na história, é certo, que quando nascemos Estado, não nascemos nação e isso é um absurdo tão enorme que deve deixar os nossos irmãos "hispanoindoafro-americanos" com os cabelos de pé!
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Pra encerrar era isto que os modernos estavam mirando: A identidade nacional!
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Mas não aquela nutrida pelas elites econômicas, que também eram e são [para a tristeza geral da nação] a elite política e que consistia basicamente reverenciar tudo o que vinha de fora e rejeitar com excessivo asco tudo que fosse popular. Dito de outra forma, eram senhores de engenho disfarçados de liberais que arrotavam francês depois de devorarem seus escravos preparados pelo mais "renomado" chef, que também era francês. [Ô tristeza, terminei o parágrafo com a sensação de que pouco mudou ...unf]
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Os Modernistas decretaram: "Tupi, or not tupi that is the question". Frase tão rica, que só ela dá um estudo imenso. Bebe não somente Shakespeare, verdadeiro mestre das artes, que começou popular, mas fora abdusido séculos depois como cânone da alta cultura; como coloca nosso dilema, tão nacional em língua estrangeira. Comer o outro é o manifesto, mas não sem antes 'degenerá-lo', 'transformá-lo', para engolir.
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Alunos e alunas ou alunas e alunos. Bom apetite, com o cardápio tupinambá! E não se esqueçam de "tranformar" tudo que venha das "gringas" antes de devorar. (:
Yo
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Oswald de Andrade.

Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.
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Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.
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Tupi, or not tupi that is the question.
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Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos.
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Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.
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Estamos fatigados de todos os maridos católicos suspeitosos postos em drama. Freud acabou com o enigma mulher e com outros sustos da psicologia impressa.
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O que atropelava a verdade era a roupa, o impermeável entre o mundo interior e o mundo exterior. A reação contra o homem vestido. O cinema americano informará.
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Filhos do sol, mãe dos viventes. Encontrados e amados ferozmente, com toda a hipocrisia da saudade, pelos imigrados, pelos traficados e pelos touristes. No país da cobra grande.
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Foi porque nunca tivemos gramáticas, nem coleções de velhos vegetais. E nunca soubemos o que era urbano, suburbano, fronteiriço e continental. Preguiçosos no mapa-múndi do Brasil.
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Uma consciência participante, uma rítmica religiosa.
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Contra todos os importadores de consciência enlatada. A existência palpável da vida. E a mentalidade pré-lógica para o Sr. Lévy-Bruhl estudar.
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Queremos a Revolução Caraiba. Maior que a Revolução Francesa. A unificação de todas as revoltas eficazes na direção do homem. Sem n6s a Europa não teria sequer a sua pobre declaração dos direitos do homem.
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A idade de ouro anunciada pela América. A idade de ouro. E todas as girls.
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Filiação. O contato com o Brasil Caraíba. Ori Villegaignon print terre. Montaig-ne. O homem natural. Rousseau. Da Revolução Francesa ao Romantismo, à Revolução Bolchevista, à Revolução Surrealista e ao bárbaro tecnizado de Keyserling. Caminhamos.
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Nunca fomos catequizados. Vivemos através de um direito sonâmbulo. Fizemos Cristo nascer na Bahia. Ou em Belém do Pará.
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Mas nunca admitimos o nascimento da lógica entre nós.
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Contra o Padre Vieira. Autor do nosso primeiro empréstimo, para ganhar comissão. O rei-analfabeto dissera-lhe : ponha isso no papel mas sem muita lábia. Fez-se o empréstimo. Gravou-se o açúcar brasileiro. Vieira deixou o dinheiro em Portugal e nos trouxe a lábia.
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O espírito recusa-se a conceber o espírito sem o corpo. O antropomorfismo. Necessidade da vacina antropofágica. Para o equilíbrio contra as religiões de meridiano. E as inquisições exteriores.
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Só podemos atender ao mundo orecular.
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Tínhamos a justiça codificação da vingança. A ciência codificação da Magia. Antropofagia. A transformação permanente do Tabu em totem.
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Contra o mundo reversível e as idéias objetivadas. Cadaverizadas. O stop do pensamento que é dinâmico. O indivíduo vitima do sistema. Fonte das injustiças clássicas. Das injustiças românticas. E o esquecimento das conquistas interiores.
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Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros.
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O instinto Caraíba.
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Morte e vida das hipóteses. Da equação eu parte do Cosmos ao axioma Cosmos parte do eu. Subsistência. Conhecimento. Antropofagia.
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Contra as elites vegetais. Em comunicação com o solo.
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Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. O índio vestido de senador do Império. Fingindo de Pitt. Ou figurando nas óperas de Alencar cheio de bons sentimentos portugueses.
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Já tínhamos o comunismo. Já tínhamos a língua surrealista. A idade de ouro.
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Catiti Catiti
Imara Notiá
Notiá Imara
Ipeju*
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A magia e a vida. Tínhamos a relação e a distribuição dos bens físicos, dos bens morais, dos bens dignários. E sabíamos transpor o mistério e a morte com o auxílio de algumas formas gramaticais.
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Perguntei a um homem o que era o Direito. Ele me respondeu que era a garantia do exercício da possibilidade. Esse homem chamava-se Galli Mathias. Comia.
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Só não há determinismo onde há mistério. Mas que temos nós com isso?
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Contra as histórias do homem que começam no Cabo Finisterra. O mundo não datado. Não rubricado. Sem Napoleão. Sem César.
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A fixação do progresso por meio de catálogos e aparelhos de televisão. Só a maquinaria. E os transfusores de sangue.
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Contra as sublimações antagônicas. Trazidas nas caravelas.
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Contra a verdade dos povos missionários, definida pela sagacidade de um antropófago, o Visconde de Cairu: – É mentira muitas vezes repetida.
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Mas não foram cruzados que vieram. Foram fugitivos de uma civilização que estamos comendo, porque somos fortes e vingativos como o Jabuti.
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Se Deus é a consciênda do Universo Incriado, Guaraci é a mãe dos viventes. Jaci é a mãe dos vegetais.
Não tivemos especulação. Mas tínhamos adivinhação. Tínhamos Política que é a ciência da distribuição. E um sistema social-planetário.
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As migrações. A fuga dos estados tediosos. Contra as escleroses urbanas. Contra os Conservatórios e o tédio especulativo.
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De William James e Voronoff. A transfiguração do Tabu em totem. Antropofagia.
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O pater famílias e a criação da Moral da Cegonha: Ignorância real das coisas+ fala de imaginação + sentimento de autoridade ante a prole curiosa.
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É preciso partir de um profundo ateísmo para se chegar à idéia de Deus. Mas a caraíba não precisava. Porque tinha Guaraci.
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O objetivo criado reage com os Anjos da Queda. Depois Moisés divaga. Que temos nós com isso?
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Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade.
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Contra o índio de tocheiro. O índio filho de Maria, afilhado de Catarina de Médicis e genro de D. Antônio de Mariz.
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A alegria é a prova dos nove.
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No matriarcado de Pindorama.
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Contra a Memória fonte do costume. A experiência pessoal renovada.
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Somos concretistas. As idéias tomam conta, reagem, queimam gente nas praças públicas. Suprimarnos as idéias e as outras paralisias. Pelos roteiros. Acreditar nos sinais, acreditar nos instrumentos e nas estrelas.
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Contra Goethe, a mãe dos Gracos, e a Corte de D. João VI.
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A alegria é a prova dos nove.
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A luta entre o que se chamaria Incriado e a Criatura – ilustrada pela contradição permanente do homem e o seu Tabu. O amor cotidiano e o modusvivendi capitalista. Antropofagia. Absorção do inimigo sacro. Para transformá-lo em totem. A humana aventura. A terrena finalidade. Porém, só as puras elites conseguiram realizar a antropofagia carnal, que traz em si o mais alto sentido da vida e evita todos os males identificados por Freud, males catequistas. O que se dá não é uma sublimação do instinto sexual. É a escala termométrica do instinto antropofágico. De carnal, ele se torna eletivo e cria a amizade. Afetivo, o amor. Especulativo, a ciência. Desvia-se e transfere-se. Chegamos ao aviltamento. A baixa antropofagia aglomerada nos pecados de catecismo – a inveja, a usura, a calúnia, o assassinato. Peste dos chamados povos cultos e cristianizados, é contra ela que estamos agindo. Antropófagos.
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Contra Anchieta cantando as onze mil virgens do céu, na terra de Iracema, – o patriarca João Ramalho fundador de São Paulo.
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A nossa independência ainda não foi proclamada. Frase típica de D. João VI: – Meu filho, põe essa coroa na tua cabeça, antes que algum aventureiro o faça! Expulsamos a dinastia. É preciso expulsar o espírito bragantino, as ordenações e o rapé de Maria da Fonte.
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Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por Freud – a realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama.
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OSWALD DE ANDRADE Em Piratininga Ano 374 da Deglutição do Bispo Sardinha." (Revista de Antropofagia, Ano 1, No. 1, maio de 1928.)
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* "Lua Nova, ó Lua Nova, assopra em Fulano lembranças de mim", in O Selvagem, de Couto Magalhães
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Oswald de Andrade alude ironicamente a um episódio da história do Brasil: o naufrágio do navio em que viajava um bispo português, seguido da morte do mesmo bispo, devorado por índios antropófagos. <>

Comentários

Jussara disse…
Valeu fessor, mas é só pra esdudar através do seu texto?
Professor Alek disse…
Fique a vontade minha cara, só que não é este texto, certo ;)